A Europa do século XI foi marcada por conflitos eclesiásticos. Embora as tensões entre laicos e clérigos atraiam, há mais de um século, a maior parcela da atenção dos historiadores – especialmente as chamadas lutas entre o sacerdócio e o império -, as disputas travadas entre segmentos da própria Igreja se multiplicaram e intensificaram, logrando grande repercussão documental. Entre os casos mais frequentes da escalada de embates na “Era da Reforma Gregoriana”, estavam os confrontos entre monges e bispos, cuja eclosão repercutia em numerosas direções: sobre a dominação aristocrática, as cadeias de controle patrimonial, os fundamentos da eclesiologia, as mobilizações urbanas, os consensos jurídicos. As páginas a seguir consistem em um estudo sobre um caso assim: por volta de 1034, uma desavença opôs a alta cúpula do bispado florentino a uma parcela do monacato local preenchendo décadas com relatos de milagres aterradores, clamores populares, desafios abertos ao papado e disputas sangrentas pela autoridade jurídica. A análise histórica desse conflito articula crônicas, cartulários, epistolários e diplomática, orientada pela hipótese de que o campo de atuação dos agentes teria sido afetado por um fator singular: o desvelamento de certas emoções deslocava a geografia das prerrogativas públicas.
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RUST, Leandro. A Santidade enfurecida: monges e bispos medievais em uma disputa pelas emoções públicas. Revista Medievalista, v. 28, p. 279-310, 2020.