Se considerarmos a importância de vencer a lacuna cultural que, no Brasil, tem marcado nossa ignorância sobre o mundo árabe, este livro é um marco decisivo ao romper o silêncio e deixar que ouçamos as vozes da cultura islâmica. De seus múltiplos aspectos, destacamos três que nos parecem dos mais relevantes neste belo livro. Graças à sua estrutura interdisciplinar e à organização comparativa dos ensaios, torna manifesta a particularidade da língua e da literatura, da história e do direito, das práticas e do pensamento árabes, e, simultaneamente, revela sua universalidade, responsável por seu papel cabal na formação do pensamento judaico e cristão e, portanto, na constituição da cultura do Ocidente. Ao fazê-lo, ressalta o segundo aspecto, qual seja, seu significado político, pois nosso desconhecimento do modo de ser e viver, de dizer e pensar próprio da cultura islâmica nos torna presas fáceis dos interesses de uma ideologia que transforma os árabes em fanáticos religiosos, terroristas inimigos da paz e da liberdade. Deixamo-nos persuadir pela imagem do bárbaro, figuração malévola do Outro como aquele que põe em perigo nossa identidade e contra o qual é preciso defender-se. Os ensaios aqui publicados desfazem de maneira vigorosa essa imagem preconceituosa e nos conduzem tanto à compreensão do sentido da diferença cultural como à percepção da proximidade entre Oriente e Ocidente no momento da instauração da cultura ocidental, convidando-nos a acolher a diferença e a reconhecer no distante o próximo. Finalmente, este livro atesta de maneira inequívoca a qualidade e a riqueza teóricas, o rigor conceitual e a abertura de novos caminhos interpretativos, bem como o alto grau de desenvolvimento dos trabalhos acadêmicos ibero-brasileiros dedicados às múltiplas facetas do Islã clássico.